quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Como viver da escrita no Brasil

No que pese ser pensamento comum que artista (entenda-se incluídos os escritores) são ricos, que ganham fortunas com a publicação de seus livros e, especialmente quando eles acabam virando filme, o escritor é um tipo de artista muito diferente, incapaz de fazer shows (esta sim, uma grande fonte de receita para os cantores) e, na maioria das vezes, tímido demais até para aparecer em público. Lembremos que uma das características do escritor é ser introspectivo, vivendo num universo particular e quase sempre pouco disposto a compartilhar essa solidão.
No Brasil, e no resto do mundo, a parte que cabe como direitos autorais para quem escreve varia de cinco a no máximo doze por cento do preço de capa de cada livro. Não só é pouco, como também as prestações de contas – quando acontecem – são de seis em seis meses, quando não de ano e ano. Para agravar, este é um país onde ainda se lê pouco. Assim, vender cinco mil exemplares de um romance, por exemplo, é uma árdua e, normalmente, inglória batalha. Porém, suponhamos que o romance escrito pelo autor Fulano de Tal tenha sido um sucesso de vendas e, nos primeiros três meses após o lançamento, ele tenha conseguido vender os cinco mil exemplares tirados a R$45,00 cada um (era um romance com mais de 300 páginas). Após seis meses do lançamento, o Sr. Fulano de Tal receberá a vultosa importância (isso, se a editora realmente pagar) de R$22.500,00. Desta importância temos de descontar o Imposto de Renda (que vem descontado na fonte) e, portanto, sobrarão R$16.312,50 que ele terá de dividir por 6 (ele esperou 6 meses para receber e, durante esse tempo, com sorte, acumulou contas e tudo o mais). A conta dá o preocupante e assustador resultado de R$2.718,75 por mês. Pouco demais se levarmos em consideração que o aluguel de uma casa média não sai por menos de R$1.000,00 e que um plano de saúde familiar também médio não sai por menos de R$500,00. Sobram pouco mais de R$1.200,00 para alimentação, farmácia, vestimentas, luz, água, gás, telefone, etc... Em resumo, não dá. Ou, se dá, esse escritor estaria bem melhor de vida se decidisse dar aulas de economias doméstica ou se fizesse espetáculos de mágica, pois eu não conheço nenhuma mandrakaria que possibilite uma família sobreviver com dignidade e mantendo o status intelectual com uma tal ninharia.
E é importante lembrar que o romance foi um sucesso de vendas! 5 mil exemplares vendidos em três meses não é para qualquer um!
Porém, Fulano de Tal é um autor extremamente otimista e conformado. Ele acha que, uma vez tendo obtido sucesso com seu livro, e a edição estando esgotada, a editora vai se apressar em mandar rodar uma segunda edição. Ledo engano... O editor acha que quem tinha de comprar aquele livro já o fez e que, a partir daquele instante, as vendas não vão compensar o custo de uma reimpressão.
E então? Não há saída? Realmente não é possível sobreviver da escrita?
Há uma saída, embora a maioria dos escritores – e em especial aqueles que ainda são movidos pela maldita vaidade intelectual – não gosta: investir em seu próprio trabalho. Ou seja, acreditar em seu taco.
O autor sendo dono de sua edição, em primeiro lugar não vai investir à toa. Ele procura uma editora séria e um editor honesto que o vai esclarecer sobre os riscos de juma alta tiragem e as desvantagens de tiragens pequenas demais. Isso mesmo! Apesar de uma alta tiragem (acima de 2 mil exemplares) baratear o custo unitário do produto final, leva a um alto risco de encalhe com a dificuldade de vendas. Assim a tiragem ideal é de mil exemplares. Se houver necessidade de mais livros, basta apertar um botão e o custo de uma nova edição dificilmente ultrapassará os 60% da anterior.
Assim fez o Sr. Fulano de Tal. Ele encontrou um editor honesto, proprietário de uma editora que, no pacote, oferecia a divulgação e a distribuição da obra. Diga-se de passagem, o livro ficou bonito, as revisões e copidesque foram criteriosos, a capa era chamativa... O livro pode ser vendido a R$50,00 o exemplar.
Fulano de Tal apertou o cinto, chorou e acabou conseguindo dividir os R$12 mil do investimento em sua obra em quatro parcelas.
Seria duro pagar R$3 mil por mês durante quatro meses, mas era preciso. Se ele fosse dentista, o investimento nos equipamentos e insumos de seu consultório seriam no mínimo dez vezes isso...
Pronto o livro, o editor sugeriu que um lançamento fosse feito, mas não numa livraria (como é o hábito) pois nesta, além de segurar por três meses o pagamento dos exemplares vendidos, fica ainda com uma porcentagem que varia de quarenta a cinquenta por cento dos valores obtidos. E, pior, habitualmente não fica com o livro.
Ajudado pelas sugestões do editor, Fulano de Tal foi conversar com um amigo, dono de uma pizzaria bastante movimentada e combinou para fazer lá o seu lançamento. Não teria de pagar nada, ganharia uma pizza por conta da casa e, de seus convidados, aqueles que quisessem consumir alguma coisa, que pagassem. Todos sairiam ganhando.
Na noite do lançamento, a boa notícia: a pizzaria lotou, todos compraram e foram vendidos nada menos que 150 exemplares. Mesmo antes do lançamento, Fulano de Tal conseguiu vender para parentes e amigos de outras cidades que sabidamente não compareceriam à festa, mais 100 exemplares. Ora, com 250 exemplares vendidos – e recebido o dinheiro correspondente – Fulano de Tal conseguiu reaver com sobra o investimento feito na execução de seu livro. O que viesse depois disso, seria lucro.
Então, muito honesto, sério e amigo, o editor lhe disse que não compensava entregar os 750 exemplares restantes para uma distribuidor, pois esta haveria de cobrar no mínimo 65% do preço de capa. O jeito era confiar nas vendas através do sistema de marketing e distribuição da própria editora, que possuía uma loja virtual e que efetuava bastantes vendas pela internet, retendo 30% do valor das vendas a título de despesas administrativas – o que incluía embalar e remeter pelo Correio as encomendas. E, no correr dos seis meses seguintes, Fulano de Tal vendeu mais 500 livros. Sobraram em suas mãos R$17.500,00. E ainda restaram mais 250 exemplares para serem vendidos e que, uma vez desovados, garantiriam facilmente a segunda edição do livro ou, pelo menos, a metade do próximo romance.
Percebe-se, assim, que é possível viver da escrita no Brasil. Porém, é indispensável investir. É indispensável, também, despir-se da vaidade tola que leva o escritor a querer assinar um contrato com uma editora que vai investir em seu trabalho. E é fundamental encontrar um editor sério e honesto. Sério a ponto de conseguir lhe dizer que seu manuscrito não tem futuro, se for o caso. Honesto a ponto de não querer tomar-lhe o dinheiro, cobrando apenas e tão somente o que em justo pelos trabalhos de revisão, copidesque, preparação, impressão divulgação e venda dos livros.
E, podem ter certeza, esse editor existe. E está muito mais perto do que vocês podem imaginar.

1 comentários :

Pois eu passei por isso Ryoki. Acabei editando por mim mesmo meu melhor livro (na época). Fui aprovado por uma editora mas queriam meus rins, então resolvi desbravar. No entanto fui surpreendido as avessas! Encalhado com mil livros embaixo do braço, as livrarias não pegam o meu livro! Nem ao menos leem! Eu tive ótimas criticas de desconhecidos, mas nada disso importa, pois as livrarias só querem receber o livro da mão de distribuidoras! Bizarro. Confesso que parei de escrever, só agora retornando. Vendi uns 50 livros em dois anos (amigos e conhecidos), e distribui de graça mais de 200. Então decidi distribuir de graça no formato digital, para que ao menos meus livros possam ser lidos, mas ai outro choque: As pessoas não fazem download, preguiça de ler! Ando me questionando muito sobre isso, e vou te dizer que escrevo bem amigo Ryoki, se eu escrevesse mal, me limitaria a própria insignificância! ...

Postar um comentário